O “agricultor louco” que quebrou um paradigma milenar e transformou a agricultura no Brasil


O agricultor Herbert Bartz/Reprodução

Herbert Bartz tomou uma decisão, há quase cinquenta anos, que mudou o seu destino

 

 

Hoje vou usar esse espaço para reproduzir parte de uma reportagem de Wilhan Santin que homenageia uma pessoa que teve uma contribuição fundamental para o Brasil se tornar hoje o grande produtor mundial de alimentos: o agricultor Herbert Bartz.

 

 

 

Herbert Bartz tomou uma decisão, há quase cinquenta anos, que mudou o seu destino, o destino do solo brasileiro e o próprio destino do Brasil. Para quem é da agricultura, sabe o que foi a importância do arado no cultivo da terra. Para quem não é, só para se ter uma ideia, estudos arqueológicos apontam que faz aproximadamente sete mil anos que os seres humanos inventaram o arado, um instrumento fundamental para que a agricultura passasse a ser utilizada com mais eficiência.

 

 

 

 

Agora imagine como foi a reação de agricultores do interior do Paraná, no início da década de 1970, quando um sujeito começou a dizer que não iria mais usar arado. Deixaria de preparar o solo e plantaria em cima da palha que sobrara depois da última colheita; contrariando milênios de história e o que sempre haviam feito os pais e avós daquela turma toda.

 

 

 

 

Não deu outra: “Ele ficou louco” era a frase corrente no município de Rolândia e arredores para o qualificar quando ele vendeu todos os seus arados e grades, máquinas de plantar e até tratores; aparecendo em seguida com uma máquina importada dos Estados Unidos que ninguém jamais tinha visto. A danada fazia o tal do Plantio Direto.

 

 

 

 

 

A história começa em 1971. Herbert Bartz estava tocando a Fazenda Renânia, de 101 hectares, em Rolândia, junto de Ulrich, seu irmão mais novo. Eles pagavam arrendamento para o pai, Arnold, que havia desistido das agruras de ser agricultor. A erosão era o grande mal da agricultura brasileira na década de 1970. Grande parte das terras férteis do país eram arrastadas, ano a ano, para os rios.

 

 

 

 

 

Herbert Bartz não se conformava com aquilo. Como podia um agricultor assistir à sua maior riqueza, o solo, ir se desfazendo e não se inquietar? Todas as vezes que o tempo armava para tempestade, ele não conseguia dormir. Sabia que parte de sua terra, arada e gradeada, iria embora.

 

 

 

Em Londrina, um agrônomo visionário, chamado Rolf Derpsch, desenvolvia um trabalho no Instituto de Pesquisa Agropecuária Meridional (Ipeame), embrião do Iapar. Ele visava desenvolver técnicas de preparo mínimo do solo e fazia algumas experiências em parceria com Bartz. Foi Derpsch que aconselhou o amigo a ir atrás de mais informações em outros lugares do mundo.

 

 

 

 

 

Bartz financiou passagens aéreas da Varig em dez vezes. Foi à Alemanha e à Inglaterra. Não encontrou o que procurava. Em seguida, visitou os Estados Unidos, onde já havia feito contato com o professor Shirley Philips, em Lexington, no Kentucky. Juntos, foram à propriedade Harry Young Jr. Esse agricultor estava fazendo Plantio Direto desde 1962 e fez uma demonstração para Herbert, plantando sobre uma farta palhada de milho que estava sobre a terra. Sem revolver o solo, sem deixá-lo exposto, o que minimizava os riscos de erosão.

 

 

 

“Eu quase levitei. Foi o momento de virada na minha vida”, relata Bartz.

 

 

 

Para encurtar a conversa. Da propriedade de Young Jr., o brasileiro foi direto à fábrica da Allis-Chalmers, onde encomendou uma plantadeira igual a que havia visto na propriedade do mais novo amigo americano.

 

 

 

Daí em diante, Herbert Bartz teve que começar o Plantio Direto já em 1972, porque a geada dizimou todo o trigo que ele havia plantado. Vendeu o equipamento de plantio convencional para fazer dinheiro e já passou a utilizar a máquina da Allis-Chalmers, que permitia plantar sobre a palhada, em larga escala. O primeiro da América Latina a fazer isso.

 

 

 

Chegou a ter a sua primeira safra de soja sob Plantio Direto confiscada pela Polícia Federal, por causa de denúncias anônimas que diziam que o alemão estava com práticas irregulares. Mesmo assim continuou e foi ficando conhecido, sendo visitado por produtores de todo o Brasil, inclusive por Nonô Pereira e Franke Dijkstra, respectivamente de Palmeira e Carambeí; homens que acreditaram na nova tecnologia e passaram a difundi-la amplamente.

 

 

 

Bartz teve que fazer contrabando de herbicida, indo buscar no Paraguai, em pequeno avião monomotor, pois o produto era proibido no Brasil. Se não fizesse isso perderia tudo para o mato, já que a principal dificuldade era controlar as plantas invasoras. Não havia produtos eficientes no mercado nacional.

 

 

 

 

Com o tempo foi desenvolvendo suas próprias máquinas para trabalhar no sistema e ajudou a indústria a desenvolver muitas outras, sendo consultor informal de várias fábricas de implementos. Ajudou a fundar a Federação Brasileira de Plantio Direto na Palha e Irrigação (FEBRAPDP), que financia pesquisas em SPD, o que contribuiu para cada vez mais agricultores, de vários estados do Brasil e de toda a América Latina, aderirem ao Sistema Plantio Direto.

 

 

 

Atualmente, o SPD é uma realidade no Brasil. Louco é quem não o pratica. Permite três safras por ano – já que se planta imediatamente após a colheita, sem perder tempo “preparando” o solo – e fez com que áreas como o Cerrado se tornassem altamente produtivas, assim como alavancou os índices de produtividade de grãos de todo o Brasil.

 

 

 

O SPD permite que a água não escorra mais, levando o solo junto. Ao contrário: protegido pela palha, o solo absorve a água e pode reservá-la para os momentos de seca. Além disso, o sol escaldante não torra o solo e a vida ali abunda, com minhocas, besouros, joaninhas; verdadeiros amigos da terra, aumentando a matéria orgânica e a fertilidade.

 

 

 

Com tanta produtividade, o agronegócio segura o PIB do Brasil, especialmente nestes tempos de crise.

 

 

 

Hoje, aos 83 anos de idade, Herbert Bartz vive em Rolândia/PR.

 

 

 

Nossa eterna gratidão a ele!





Deixe seu comentário: