Já tive covid-19. Posso me reinfectar?


Secom/SC

Instituto Federal de Santa Catarina publicou um guia para esclarecer essa dúvida

 

 

Quem já teve covid-19, mesmo que com sintomas leves, não deve relaxar as medidas de prevenção e nem deixar de se vacinar. Casos de reinfecção estão aparecendo em várias partes do mundo. O primeiro caso foi registrado em Hong Kong, em agosto do ano passado. No Brasil, já são 11 casos confirmados pelo Ministério da Saúde, sendo que o primeiro foi registrado no Rio Grande do Norte em dezembro de 2020. Em Santa Catarina, o primeiro caso confirmado foi em Lages, em um paciente que testou positivo em setembro de 2020 e novamente em fevereiro de 2021.

 

 

 

No mês em que o Brasil registra o primeiro caso confirmado de morte de uma pessoa reinfectada por covid-19, um homem de 39 anos do Rio Grande do Sul, o Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), através do post IFSC Verifica, conversou com o biólogo, pesquisador e professor de Imunologia do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia (MIP) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Daniel Santos Mansur sobre a relação entre o vírus Sars-Cov-2 e a imunidade.

 

 

 

Segundo o pesquisador, já foram realizadas várias descobertas sobre esse coronavírus, porém, um ano de pesquisas ainda é pouco para a ciência ter certezas sobre o comportamento do vírus, como a duração da imunidade ou mesmo alcance das vacinas. O que já se sabe é que, neste momento, pessoas que já tiveram a doença devem manter as medidas protetivas, como uso de máscara e distanciamento social, e se vacinar quando chegar a vez.

 

 

Quais as chances de uma pessoa se reinfectar com o vírus Sars-Cov-2, causador da Covid-19?

Casos de reinfecção por covid-19 estão sendo registrados em várias partes do mundo, inclusive no Brasil. No dia 20 de abril, foi registrado o primeiro óbito de um paciente comprovadamente reinfectado pelo vírus, no Rio Grande do Sul. O caso foi relatado em artigo pré-print publicado na revista Research Square (em inglês), e aponta que o paciente, um homem de 39 anos, foi infectado por duas variantes diferentes (P1 e P2) no período de cerca de quatro meses.

 

 

 

Segundo o pesquisador Daniel Santos Mansur, a possibilidade de uma pessoa se reinfectar por Sars-Cov-2 é real. Porém, ainda não se sabe em qual proporção isso acontece. Ele explica que há alguns tipos de coronavírus, conhecidos há mais tempo, que têm um tempo de imunidade de cerca de três meses, sendo que o Sars-Cov-2 parece ter um tempo um pouco maior. Há indícios de que o indivíduo pode ficar até um ano com uma boa imunidade, depois ela vai decaindo, mas como a descoberta do vírus tem pouco mais de um ano, é difícil falar em algo além disso.

 

Veja a explicação completa do pesquisador no vídeo:

Qual a diferença entre a reinfecção e os sintomas persistentes da covid-19?

Daniel Mansur explica que os vírus de RNA, como o Sars-Cov-2, podem apresentar infecções persistentes (saiba mais sobre sintomas persistentes e sequelas). Esses vírus podem ficar de forma inativa em algum órgão, como olho, testículo ou cérebro, e em algum momento podem voltar a replicar e a circular no corpo. Por exemplo, há comprovação de reaparecimento do vírus ebola em um paciente até três anos após a contaminação. “A gente não sabe ainda para o Sars-Cov-2, se ele fica persistente nesse sentido. Tem gente que fica até quatro meses com o vírus no trato respiratório superior. A pessoa está com vírus, não necessariamente doente, e ele está potencialmente transmitindo esse vírus”, alerta.

 

 

 

Ainda de acordo com o pesquisador, há pouco tempo de estudos e poucos casos confirmados para se saber se a reinfecção é uma característica do vírus ou algum problema no organismo da pessoa que faça com que os sintomas reapareçam, como alguma doença que cause imunossupressão, interferência de medicamentos, entre outros. Ele explica que, no caso do ebola, já há evidências de que se trata de uma característica do vírus. Também cita o exemplo do herpes simples, um vírus que acomete a maioria da população e fica alojado no nervo trigêmeo da face. Quando o portador tem um episódio de diminuição da imunidade, o vírus reaparece, causando lesões nos lábios.

 

 

 

A Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiu documento em que explica mais detalhadamente por que, com base em outros tipos de coronavírus, a reinfecção pelo Sars-Cov-2 não deve ser descartada.

 

 

 

Qual a relação entre reinfecção e as novas variantes de covid-19?

O pesquisador Daniel Mansur explica que quanto mais distante uma variante está do vírus inicial, mais fácil seria ela reinfectar uma pessoa. Ou seja, quanto mais o vírus evolui e se modifica, aumentam as chances de o sistema imune “enxergar” o vírus de forma diferente que na primeira infecção e não conseguir se proteger da nova variante. “No entanto, parece que, no caso das vacinas, que foram desenvolvidas para o vírus inicial, ainda se tem uma proteção adequada quanto às novas variantes, ou pelo menos que evite a doença grave”.

 

 

 

Diante disso, o pesquisador acredita que possa haver uma certa imunidade em quem já se infectou inicialmente frente às novas variantes. “Até o momento eu não saberia dizer se essas variantes que temos circulando seriam suficientes para justificar reinfecções, até porque eu esperaria ver muito mais reinfecções atualmente, porque temos praticamente a P1, a variante da Amazônia, circulando em todo o Brasil”, afirma.

 

 

 

Segundo o Boletim Epidemiológico 59 do Ministério da Saúde, dos 11 casos de reinfecção confirmados no Brasil, cinco são de Variantes de Atenção (Variants to Concern – VOC, em inglês). A principal VOC identificada no Brasil é a P.1.

 

 

Veja na tabela abaixo onde estão localizados os casos brasileiros registrados até 14 de abril. O caso registrado no Rio Grande do Sul em 20 de abril não consta nessa tabela:

Como a reinfecção é detectada?

Detectar uma reinfecção é algo que precisa seguir vários passos. O Ministério da Saúde (MS) emitiu uma Nota Técnica em novembro de 2020 com orientações aos serviços de saúde sobre como identificar casos de reinfecção. Segundo o documento, devem ser consideradas algumas situações antes da confirmação de casos:

 

  • Erros na coleta do material para testagem diagnóstica;
  • Uso de testes com baixa sensibilidade e especificidade;
  • Diferenças na resposta imunológica dos indivíduos ao vírus e uso de medicamentos que podem debilitar o sistema imunológico dos pacientes, fazendo com que uma infecção que aparentemente estivesse curada corresponda à persistência de uma mesma infecção.

 

São considerados pelo MS como casos suspeitos indivíduos com dois exames RT-PCR positivos em um intervalo igual ou maior a 90 dias. A partir disso, as amostras desses exames são enviadas a laboratórios de referência – Fiocruz (RJ), Instituto Adolfo Lutz (IAL/SP), Instituto Evandro Chagas (IEC/PA) ou Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen) dos estados credenciados onde são realizados os testes genômicos.

 

 

 

“Para confirmar uma reinfecção, é preciso mostrar que o genoma que infectou a pessoa a primeira vez é diferente do genoma que a infectou a segunda vez. A chance de a gente demonstrar isso formalmente é muito difícil”, afirma Mansur. Outra forma de provar uma reinfecção é descobrir a variante da primeira infecção e, no caso de uma segunda infecção confirmada, verificar que foi de uma nova variante, ainda não existente na região em que a pessoa vive no momento da primeira infecção.

A reinfecção pode ser mais grave que a primeira infecção?

Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) indica que uma segunda reinfecção pelo Sars-Cov-2 pode ser mais grave que a primeira. Segundo os pesquisadores, uma primeira exposição à covid-19 em casos brandos ou assintomáticos pode não produzir resposta imunológica e que a pessoa pode se reinfectar, inclusive, com a mesma variante, de forma mais grave.

 

 

 

De acordo com Mansur, essa possibilidade de doença mais grave ainda necessita de estudos maiores, porém, verificando o comportamento de outros tipos de vírus, tem probabilidade de acontecer. “Não seria algo improvável do ponto de vista da virologia e da imunologia, mas precisamos de mais dados para confirmar essa gravidade”, completa.

Qual a diferença entre a imunidade adquirida após a vacina e a imunidade por infecção pelo Sars-Cov-2?

A imunidade contra a Covid-19 de uma pessoa vacinada e de outra que já teve a doença é completamente diferente. Segundo Mansur, a infecção pelo vírus pode trazer diversos danos ao organismo e sua influência sobre o sistema imune é imprevisível. Já a vacina é produzida e testada para ter um efeito específico e controlado, estimulando o sistema imune sem causar danos.

 

 

-> Saiba mais sobre imunidade natural X imunidade por vacina

 

 

Para explicar melhor, ele cita o exemplo do vírus do sarampo, para o qual existe vacina há mais de 30 anos. Descobriu-se em 2018 que o vírus do sarampo é capaz de destruir as células B, que produzem anticorpos. Ou seja, ele destrói não só as células que poderiam produzir anticorpos contra ele mesmo, como também células “fabricantes” de anticorpos para outras doenças. Assim, a pessoa acaba adquirindo uma imunodeficiência e fica vulnerável a vários tipos de infecção. “Não estou falando que isso vai acontecer com a covid-19, mas é um exemplo de como um vírus pode manipular seu sistema imune ao ponto de a resposta a ele e a resposta à vacina serem completamente diferentes”, alerta. “A vacina não faz isso, ela só estimula o sistema imune. O vírus é um organismo replicante, que evolui, e evolui rápido, como a gente está vendo no aparecimento das variantes. Não dá para considerar ele uma coisa estática igual à vacina”, completa.

 

 

 

O pesquisador lembra ainda que nenhuma das vacinas disponíveis contra a covid-19 são do tipo atenuadas, todas são ou inativadas, ou de subunidades, ou de vírus recombinantes, ou seja, elas não interagem com o organismo humano da mesma forma que o vírus. Devido à imprevisibilidade dos efeitos do vírus no organismo, é difícil afirmar precisamente quanto tempo dura a imunidade gerada por ele, pois isso depende de vários fatores, como carga viral recebida pelo indivíduo e o sistema imunológico do paciente.

 

-> Saiba mais sobre o funcionamento das vacinas.

 

Quem já teve covid-19 precisa continuar com as medidas de prevenção?

Sim, como ainda não há consenso sobre quanto tempo a pessoa fica imune após a doença, é preciso manter as medidas de prevenção, como o uso de máscaras, higiene das mãos e o distanciamento social. Além disso, essa é uma forma de evitar a contaminação de outras pessoas, pois, potencialmente, a pessoa pode continuar transmitindo o vírus mesmo após o fim dos sintomas.

 

-> Saiba a diferença entre pacientes sintomáticos, assintomáticos e pré-sintomáticos.

 

Aliás, é sempre bom lembrar que ainda não é hora de ninguém relaxar em relação às medidas de prevenção.

 

-> Já podemos relaxar as medidas de cuidado em relação ao novo coronavírus?

Quem já teve covid-19 precisa se vacinar?

Sim, quem já teve a covid-19 deve se vacinar. De acordo com o pesquisador Daniel Mansur, os níveis de anticorpos em quem teve covid-19 são muito variáveis. “A gente não sabe todo o contexto em que esses anticorpos foram produzidos, a eficácia deles em neutralizar, varia muito de pessoa para pessoa, cada uma pode ser infectada de um jeito”, explica.

 

 

 

Ao contrário, as vacinas são produzidas para gerar uma resposta imune específica, com o objetivo de bloquear a doença e/ou evitar a sua forma mais grave. Por isso recomenda-se que as pessoas se vacinem quando chegar a sua vez.

 

 

Veja no vídeo a explicação mais detalhada do pesquisador:

Qual a importância de mantermos a vacinação para outras doenças?

Mansur destaca a importância de se manter a vacinação em dia para outras doenças. Para ele, “movimentos antivacina são um desserviço à humanidade”. Ele fala da preocupação em haver um surto de sarampo, poliomielite ou outras doenças já controladas, e tudo isso em meio à pandemia de Covid-19, com hospitais lotados. “Para o pessoal refletir, o que é um mundo sem uma vacina para uma doença desse tipo. E essa é uma doença com 1% de letalidade, tem algumas que têm bem mais”, alerta.





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