É impossível assistir A Caça (já disponível em DVD), filme do cineasta dinamarquês Thomas Vinterberg, que concorre ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro no próximo dia 2 de março, sem pensar em Canoinhas.
Na cidadezinha retratada no filme, todos se conhecem, a maioria é amiga de todo mundo e se reúne nas noites frias do inverno severo para beber, contar piadas e jogar. Lá vive Lucas, um professor de jardim de infância adorado pela criançada que, de uma hora para outra vê sua vida transformada num verdadeiro inferno. Uma menina, filha de seu melhor amigo, o acusa de molestá-la sexualmente.
A diretora da escola, zelosa ao extremo, não duvida das palavras truncadas da menina. Chama logo a Polícia, os pai da menina e marca uma reunião com os outros pais. O falatório logo se alastra e todos, sumariamente, condenam o professor ao ponto de nem você mesmo entender quem tem razão nessa história.
Lembrou de algo?
Ok, vou refrescar sua memória. Em junho de 2011, a Justiça condenou a 10 anos de prisão o padre Marcos Andreiv, da Igreja Católica do rito ucraniano, em Canoinhas, por supostamente ter abusado sexualmente de uma menina de quatro anos. Ele cumpre pena na Unidade Prisional Avançada de Canoinhas.
Como jornalista cobri o caso na época e fui o primeiro a noticiar no Correio do Norte a suspeita que, até então, estava sendo investigada. Lembro-me que relutei em dar a notícia e até consultei o editor de A Notícia, o sempre prestativo e coerente Domingos Aquino, que me recomendou dar a notícia assumindo a responsabilidade integral, já que não tínhamos fontes oficiais. Fiz isso e, na sequência, a imprensa estadual passou a noticiar e acompanhar o caso que se tornou um dos maiores escândalos da cidade.
Desse dia em diante ouvi todo o tipo de reação. Gente que me procurava para defender o padre, ouvia nas rodas de conversa os comentários mais depreciativos sobre o padre e muitos queriam saber o que eu pensava sobre o caso. Quando li a sentença do juiz Rodrigo Coelho, me convenci na hora da culpa do padre e fiz uma reportagem de três páginas sobre o caso para o CN. Do que ouvi dos leitores, aquela era a última pedra que precisava ser jogada sobre o padre. Ele, de fato, era culpado.
Agora, vendo A Caça, revisei minha opinião. Quero muito entrevistar o padre. Já fiz várias tentativas, mas ele reluta em me receber na cadeia. Continuo tentando. Quero muito ouvir os argumentos dele. Não digo que me convenci de sua inocência. Quero apenas dar voz a quem, culpado ou inocente, enfrentou condenação judicial e moral sem dar um pio. Por que isso?