O Piano: um escultor da alma


“O fim da verdadeira música não é distrair-nos, mas enriquecer a nossa alma”

 

 

 

Há distintas maneiras de ler o mundo e transformar as percepções em arte, a saber – a literatura, a escultura, a pintura, as peças teatrais, o cinema e o idioma universal, isto é, a música. Esta última pode ser a partir de instrumentos musicais, do canto, ou da combinação de ambos.

 

 

 

 

Não obstante ser uma grande apreciadora dos instrumentos musicais – sobretudo do clássico e requintado piano – não é minha área de especialidade. Por isso, resolvi iniciar minha incursão nesse universo encantatório seguindo a sugestão de leitura de um canoinhense que entende muito do assunto – Leonardo Estauski Tanaka, que além de conduzir os pianos de forma exímia e tocar diversos estilos de canções, os afina e restaura.

 

 

 

 

Acompanhar seu requintado trabalho de reparação de pianos complementou a sua dica de leitura – “O Piano: um escultor da alma”, de Maria Angela Pires, e, dessa forma, pude compreender que, para além dos sons que cada tecla produz e que podem ser combinados e traduzidos em uma música, que passa por um compositor, tocar um instrumento musical promove o autoconhecimento, e a lapidação de várias habilidades.

 

 

 

A obra de Maria Angela Pires reforça o que penso como professora de Língua Portuguesa, Literatura e Línguas Estrangeiras, isto é, que a formação de um leitor se estende por toda vida, na medida em que, para sermos considerados letrados, precisamos dominar os mais diversos gêneros de textos e manifestações semânticas. No processo de aprendizagem, alguns ficam na superfície e, outros, tornam-se mestres:

 

 

 

 

Todas as pessoas são capazes de se alfabetizar na leitura porque se aprenderam a ler, também aprendem a ler notas musicais. Existem pessoas que são verdadeiros oradores, sua leitura de um texto é quase uma obra de arte com todas as entonações de voz, expressão, etc. Tem outras que leem um texto de forma linear sem muita expressão, outras ainda mesclam um pouco de poesia e um pouco de razão. Mas que todos aprendem a ler, sim, aprendem. E é o mesmo com a música. É o mesmo com a leitura de partituras: é uma alfabetização (PIRES, 2014, p.14).

 

 

 

 

 

E acrescenta que o estudo da música, especialmente a clássica, deveria integrar os componentes curriculares das escolas, uma vez que:

 

 

 

 

[…] é parte da formação integral de um ser humano, para que ele se descubra, desenvolva sua sensibilidade, coordenação motora e uma infinidade de outras habilidades. É um idioma universal. Aprender a ler música é poder ir para qualquer parte do mundo tocar com qualquer cidadão dos mais variados países utilizando a mesma linguagem, no caso, a partitura de música clássica (PIRES, 2014, p.20).

 

 

 

 

 

Ao ter aulas de piano, e se dedicar a aprender a tocá-lo, o aluno desenvolve a disciplina, a autoavaliação – pois cada um tem seu processo e cronograma – o compromisso, a responsabilidade, o gosto pelo desafio e, especialmente, a sensibilidade, que é o diferencial proporcionado pela arte.

 

 

 

 

Leonardo E. Tanaka é um exemplo concreto das premissas de Maria Angela, pois iniciou seus estudos na tenra idade, o que se estendeu por todo Ensino Fundamental, sendo aluno das Irmãs Franciscanas Missionárias de Maria Auxiliadora do Colégio Estadual Sagrado Coração de Jesus, onde, além de outras habilidades, aprendeu a tocar piano, sempre tendo como lema que “O fim da verdadeira música não é distrair-nos, mas enriquecer a nossa alma”.

 

 

 

 

Ao cursar o Ensino Médio na Escola de Educação Básica Almirante Barroso, realizou sua pioneira afinação do piano desta instituição. Depois, se especializou em cursos argentinos de restauração. Agora segue, em seu “Ateliê de Órgão e Piano”, com os serviços supramencionados. Ele acrescenta que, para afinar e restaurar um piano, é necessário, além do conhecimento musical, entender de marcenaria – para saber lidar com a madeira –  e de alfaiataria, pois é preciso confeccionar capas, estofados, usar feltro, tecido de casimira e couro. Eu adiciono, ainda, a inteligência matemática e espacial, uma vez que se trabalha com medidas, em que cada milímetro é crucial para o sucesso do resultado. Com isso, é possível corroborar o mencionado pela escritora Maria Angela, isto é, de que o estudo e o trabalho com piano proporcionam o desenvolvimento integral do ser humano, porquanto faz mister diversos saberes.

 

 

 

 

Sua missão é muito importante e merecedora de reverência pois, com as aulas e com a manutenção de pianos, impede que a tradição da música erudita se torne obsoleta, além de ser um instrumento para instigar os mais sublimes sentimentos humanos.

 

 

 

 

Minha experiência de leitura da obra “O Piano: um escultor da alma”, e de acompanhar o trabalho de afinação e lapidação de Leonardo Tanaka, me fez lembrar de um poema da angolana Isabel Morais Ribeiro Fonseca. É com ele que finalizo meu texto, o qual, por si só, sintetiza a beleza e a importância dos instrumentos musicais, bem como a necessidade de valorizá-los e mantê-los atravessando gerações. Assim, não deixamos que, conforme o derradeiro verso, agonizem com o tempo, mas sim que acompanhem e carreguem “sonhos longos, profundos e eternos”:

 

 

 

É o piano

 

A tecla do piano está solta

Com sons agoniados, agonizados

Velho como um lavrador que cultiva

Versos de mil palavras, notas soltas

 

Sonhos longos, profundos, eternos

Castelos em traços que descrevo

Estrelas que iluminam e beijam o coração

Piano velho, gasto, que agoniza no tempo!

(Isabel Morais Ribeiro Fonseca)

 

 

 

(PIRES, Maria Angela. O Piano: um escultor da alma. Autoconhecimento através do piano numa didática para a vida. São Paulo: Ribeirão Gráfica e Editora, 2014).





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