Oração Acadêmica


Ousada a minha atitude em aceitar que hoje, aqui, agora, esteja eu lendo estes rabiscos meus, esta pretensa Oração Acadêmica.

Ousada eu, que no calor de uma reunião, não contestei esta indicação.

Ousadia minha, sim.

Porque a muitos é concedido o dom da bela escrita e do bem falar.

E porque todas as minhas confreiras e todos os meus confrades, integrantes desta nossa ainda novel Academia de Letras de Canoinhas, filiada à Academia de Letras do Brasil, poderiam fazê-lo com mais probidade que eu.

Pois estamos todos no mesmo barco.

Somos todos amantes dos escritos, a mente de todos nós é feita das mesmas penas e dos mesmos papéis que foram colados em nosso dorso, em nossa pele, em nossos neurônios, em nossa alma.

Credito a aceitação de todos vocês, amigas confreiras e amigos confrades ao tempo que aqui me resta, pois, parodiando o grande Érico Veríssimo, nem sei por que aqui estou se já sou quase uma vaga…

Talvez porque histórias eu tenha para contar.

E após eu contornar com os meus olhos a mesa onde estávamos naquela noite, naquela reunião, senti flechas lançadas pelo olhar de todos.

E foram aqueles olhos em meus olhos, foram aquelas palavras de estímulo que me levaram a apagar as negativas que se formavam em minha mente.

E um iminente recuo meu por curtas palavras apenas balbuciadas, não foi suficiente para dissuadi-los de que haveria ali alguém que melhor do que eu fizesse esta Oração.

Capitulei.

E eis-me, então, aqui pedindo a todas as deusas e a todos os deuses do Olimpo que estejam conosco hoje e sempre.

Que os mesmos deuses e as mesmas deusas que sempre estimularam e incentivaram a arte literária de romanos e gregos e de todos os povos em todos os tempos possam estar conosco em todas as horas também.

E que destes seres superiores, que circundam a nossa ainda inculta e ainda grosseira crosta terrestre, possam emanar fosforescentes halos de luz a fim de iluminar e aquecer o nosso eu, os nossos frios neurônios, as nossas frágeis mãos, para que, de poemas possamos impregnar o mundo que nos rodeia.

Que estes entes iluminados possam impregnar o nosso Eu imortal e nos conduzir aos infinitos de nós mesmos, para o aprimoramento de nossos escritos, para a eternização e o crescimento deste grupo, para que somente de amor possamos estar envoltos, para que, enfim, a cada dia, mais e mais luminares das letras possam proliferar em nosso meio.

Porque eu já tive um sonho.

Nós tivemos um sonho.

Era o Sonho.

Não sei se o sonho se foi com ela quando ela se foi.

Ou, se, mesmo com ela, este sonho teria sido somente nada mais que um mero sonho.

 

 

Porque éramos um punhado de loucos,

mas éramos poucos, muito poucos,

e os nossos clamores

que então eram apenas vagidos roucos

se esfacelaram ao encontro de muitos paredões

e de múltiplos muros moucos.

 

Era um tempo em que em nossa imaginação, tudo ao redor, apenas um lindo tapete de poemas seria.

E queríamos enfeitar estes poemas com as mesmas cores com as quais o Criador enfeitou a terra.

E destes sonhos nossos surgia um Projeto, o Projeto Ilex Pró-Arte.

Para que todo este sonho reunido pudesse estar em noite de gala, em noite de estrelas, em noite de talentos.

E foi ela, ela de nome Isis e também Maria, ainda Tack e depois Baukat, ela, a Patronesse da cadeira que ocupo nesta nossa Academia de Letras de Canoinhas, ela sim, quem aglutinou as pessoas em torno desta ideia e com amigos de Curitiba, de lá traria uma orquestra de concertos e um coral que com o nosso Santa Cecília a tudo emoldurariam com música.

E a noite de gala aconteceu.

No Clube Canoinhense.

Onde poemas afloraram de muitas almas tristes.

Onde o envolvente som que emanava dos instrumentos musicais e das vozes dos corais, ecoando através de meras paredes, atingiu os páramos celestiais e continuam ecoando dentro de mim até hoje.

Onde pinturas de nossos artistas plásticos, de Zezé Ganem a maioria,

foram a nota preponderante na decoração daquela noite.

Porque este era o sonho.

O Projeto Ilex Pró-Arte seria o propulsor da nossa arte a incentivar um mundo ainda por vir.

Mas aquela noite de gala foi só para homenageá-la porque ela já não mais estava entre nós.

Lá ela estava, sim, como hoje e agora aqui está.

E a Academia de Letras de Canoinhas, há décadas por nós sonhada, desvaneceu-se também com a partida dela.

Teria vicejado?

Não saberia dizê-lo.

Eram tempos diferentes.

Eram tempos difíceis.

Tempos em que poemas eram queimados, tempos em que poemas eram rasgados, tempos em que poemas eram jogados em sarjetas, tempos em que poemas eram atirados em latas de lixo pela incompreensão de um mundo que neles não via e neles não sentia o capital.

Era um tempo em que alguns que um pouco escrevessem espezinhavam os que tinham menor poder de voz e então, poemas de fundo, magníficos poemas foram atirados para o meio do lodo que margeava a vida.

Era um tempo e era um mundo que enterrava poemas entre pedras e cinzas para que fenecessem no tempo.

Mas os poemas eram fortes e qual flor de lótus que do lodo sempre emana e sempre viceja, os poemas submersos afloraram e começaram a ser entoados e começaram a ser cantados em todos os cantos de nossa Santa Cruz terra.

E todas aquelas flores de lótus se aglutinaram e se juntaram a muitas outras flores em um imenso jardim. Jardim repleto de muitas, imensas, variadas e coloridas flores que eu espero ver vicejar sempre mais, qual flor de lótus, emergindo cada vez mais e mais bela das profundezas dos lodaçais que por décadas as submergiram.

E porque foi num repente que de poemas a terra nossa foi tomada. E porque multiplicaram-se os poemas e porque multiplicaram-se as vozes que ovacionaram os poemas e porque multiplicaram-se as mãos que aplaudiram os poemas que possível foi agregar esta plêiade que hoje é a nossa Academia de Letras de Canoinhas.

Esta é a nossa flor de lótus, a nossa renascida flor de lótus, a nossa modesta seccional de Canoinhas, Santa Catarina, da Academia de Letras do Brasil, aglutinadora dos poemas todos estagnados dentro de nosso eu.

 

(Li este texto na noite 20/05/2015,

por ocasião da celebração

 do primeiro aniversário da

Academia de Letras de Canoinhas.)





Deixe seu comentário: