Os bingões e a luta para construir a nova UTI do Hospital Santa Cruz de Canoinhas


UTI do Hospital Santa Cruz/Arquivo

“Porque poderá acontecer comigo com alguém de minha família” é o refrão que sempre soa na cabeça de cada pessoa

 

 

 

 

 

Com a evolução tecnológica os aparelhos de anestesia e os respiradores que usávamos tornaram-se objetos de museu. Esquecidos em algum canto. Talvez algumas peças barganhadas por aí. Ou quem sabe como produto de troca para outros mais modernos. Deixei no Hospital Santa Cruz todas as minhas aquisições.

 

 

 

Porque nas andanças do tempo inovações vão surgindo. E com novas mentes, que fresquinhas chegam de seus cursos de atualização, novos instrumentos de trabalho vão sendo solicitados. Porque em suas andanças o tempo não para.

 

 

 

 

Porque nas andanças do tempo aquela salinha com dois leitos apenas e que tanto servira para fazer voltar à vida tantas pessoas, ficara muito pequena. Necessárias seriam mais salas, mais leitos, mais aparelhagem, mais pessoal capacitado.

 

 

 

Não gosto de citar nomes, pois poderei deixar de lado uma grande parcela de pessoas que contribuíram ativamente para que tivéssemos um espaço físico ampliado onde uma verdadeira Unidade de Terapia Intensiva pudesse ser instalada. Necessário, porém, é um ponto de partida. Por esta razão o nome de dois personagens, mais diretamente ligados à causa, eu precisarei citar.

 

 

 

 

Baseando-se em uma ideia, trazida por alguém da área política, e que estudava no campus de Canoinhas da Universidade do Contestado, um grande desafio foi lançado para se obterem os recursos financeiros. Uma ideia similar à realizada em uma cidade aqui de nossa região do Planalto Norte. Em Rio Negrinho. E o político, Mauro Mariani. Ideia abraçada, de imediato pela diretoria de nossa casa de saúde, que tinha como presidente o senhor Agenor Cristófoli.

 

 

 

 

A ideia, um grande evento denominado Bingão. Arregaçaram-se as mangas de todas as entidades e sociedades de nossa cidade. Porque a finalidade era uma só. “Porque poderá acontecer comigo com alguém de minha família” é o refrão que sempre soa na cabeça de cada pessoa.

 

 

 

 

E o Bingão do Hospital Santa Cruz levou multidões ao nosso Parque de Exposições. Quando prêmios espetaculares foram sorteados.

 

 

 

E então a construção de uma ala destinada a uma UTI pode ser iniciada.

 

 

 

 

Jamais se pode pensar apenas em uma área física quando se fala em assuntos referentes a saúde, a ambulatórios médicos, a hospitais. Porque não se trata de uma construção comum. Requisitos mil são solicitados pela Vigilância Sanitária. Delimitação de espaços. Tamanho exato em metros quadrados. E cúbicos.

 

 

 

 

Realização de outros Bingões foram necessários. Porque muito ainda faltava para se concretizar o novo sonho. Camas especiais foram adquiridas. Alguns respiradores. E mais a parafernália que acompanha cada leito de UTI.

 

 

 

Desde os primórdios, quando se pensava na necessidade de se construir esta Unidade de Terapia Intensiva em nosso hospital, também na Câmara Municipal as discussões ocorreram.

 

 

 

 

O vereador Jaime Muehlbauer, no decorrer de seu mandato, em nossa Câmara Municipal, sabendo dos serviços prestados por minha Nonna Thereza Gobbi à coletividade canoinhense, com seu incansável trabalho para a construção de um hospital em nossa região, elaborou um projeto de lei no qual propunha o nome dela para a UTI que seria erguida. E a lei foi aprovada.

 

 

 

 

Recebi, na época, um ofício de meu amigo e conterrâneo Jaime, informando-me e à minha família desta homenagem. Jaime não viu a inauguração da UTI. Mas no momento em que eu cortava a fita, juntamente com o governador do estado, a imagem daquele risonho rapazola de Marcílio Dias de minha mente não saía. Devia, certamente, estar ali, ao lado de minha Nonna. Felizes, junto conosco, pela abertura de um espaço que ressuscitaria tantos conterrâneos nossos.

 

 

 

Necessário era um credenciamento. Junto ao SUS. Para se pagar as despesas inerentes àquele espaço especial. Foi uma quase interminável Via Sacra. Porque faltavam equipamentos. Porque a iluminação não estava conforme os ditames oficiais. E até porque a metragem das salas não conferia com as especificadas na planta original, previamente aprovada em instâncias superiores….

 

 

 

Quem já acompanhou a construção de um prédio, de uma casa ou até de um galpão sabe das discordâncias destas medições. No caso específico de nossa UTI eram meros centímetros… Ocasionados por mãos de massa acrescentadas a mais no reboco… Mas, até se chegar a esta conclusão. Até quase se remover uma parede para se levantar uma nova… muitas águas caíram dos céus.

 

 

 

Depois de tudo acomodado, montado e equipado conforme os ditames da lei, uma nova inauguração se fez. E a Unidade de Terapia Intensiva foi credenciada pelo SUS, pelos planos de saúde. Com ela em funcionamento a vida médica foi transformada. Para melhor.

 

 

 

Médicos revezam-se em plantões presenciais. Equipe de enfermagem especializada em cuidados intensivos. Medicação heroica à mão.

 

 

 

 

Novos respiradores fizeram-se necessários. Computadorizados.

 

 

 

 

Todos os aparelhos de anestesia e respiradores, bem como os oxímetros que adquiri para bem executar o meu trabalho sempre foram de procedência nacional. Produzidos pelos meus amigos Kentaro Takaoka, da Takaoka, Affonso Fortis, da Narcosul e Hans Baukelmann, primeiramente na Oftec, e depois em sua própria empresa a HB.

 

 

 

 

Aprimoraram-se estas fábricas de equipamentos de aparelhos de anestesia e de respiradores. E tantas outras mais surgiram depois. A cada ano, no decorrer dos congressos de nossa especialidade, o salão de exposição de materiais exibia um maior número de aparelhagens destinadas à anestesia e reanimação.

 

 

 

Tínhamos e temos o que há de melhor em aparelhagem fabricada no Brasil. Meus amigos aprimoravam-se em suas instalações, competindo com as melhores do mundo.

 

 

 

Posso afirmar isto porque vi, de perto, luminares da anestesia mundial visitando os nossos grandes hospitais de São Paulo e Rio de Janeiro. Eu os vi efetuarem procedimentos anestésicos com os aparelhos fabricados por meus amigos. E eu os vi estarrecidos com os equipamentos.

 

 

 

Kentaro Takaoka deixou-nos em 2010. E deixou um inestimável legado que seus filhos continuam a aprimorar.

 

 

 

Affonso Fortis, em Porto Alegre construiu uma imagem de médico e inventor sempre lembrada entre os anestesiologistas e intensivistas da capital gaúcha. E lá a empresa por ele fundada continua forte como o nome da família e sob a direção dos seus.

 

 

 

Lembro-me do dia em que meu amigo Hans levou-me para conhecer sua casa e as novas instalações de sua fábrica. Hans Bauklemann, o nosso querido alemãozinho, como carinhosamente era chamado pelos anestesistas. Era uma Jornada Paulista de Anestesia em Obstetrícia. Em 1988. Encerramento dos trabalhos no final da manhã de um domingo.

 

 

 

Mostraram-me o velho galpão que ainda funcionava como depósito. Depois fomos ao novo. Instalações de dar água na boca. Maquinário excepcional para a produção do que havia de melhor para ser usado em anestesia e em Terapia Intensiva.

 

 

 

Encontramo-nos ainda em muitos congressos e jornadas de anestesia. Sempre ao lado de Carlota, sua inteligente e culta esposa. Conversávamos muito. Ficávamos a lembrar do meu primeiro aparelho de anestesia, engendrado por ele, de baixo custo para caber dentro do meu bolso.

 

 

 

Ano passado Hans nos deixou. Deixou um nome gravado na história da anestesia. E um pedaço da história de minha vida.





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