100 ANOS DA COMARCA: Os desdobramentos da morte do vereador


Adolar (no detalhe) foi assassinado à queima-roupa ACERVO DE FERNANDO TOKARSKI

Até hoje segue um mistério a causa da morte de Faury de Lima, que rolou das escadarias da Câmara em agosto de 1955

 

Quem acompanha esta série de reportagens já percebeu que desde sempre a política ditou os rumos do Município para o bem e para o mal. Isso não era uma particularidade dos primórdios da cidade, quando os resquícios da Guerra do Contestado, o poder da Lumber e a disputa política formavam um imbróglio muitas vezes entendido somente pelas figuras públicas da época.

Um episódio ocorrido em 22 de agosto de 1955 ilustra bem isso.

Naquele dia, durante sessão da Câmara, o vereador Faury de Lima (PSD) se irritou de tal forma com o colega Silvio Mayer (UDN), que depois de ligeira troca de palavras, “em voz baixa”, conforme relatou o CN à época, arremessou uma cadeira contra Mayer. A cadeira atingiu o udenista de raspão, provocando apenas arranhões.

Sem dizer palavra alguma, Lima saiu desembestado da Câmara, que funcionava onde hoje está a Biblioteca Municipal. No caminho teria topado com o irmão marista Geraldo Luiz, diretor do Ginásio Santa Cruz.

Na pressa, acabou derrubando o padre. Os dois rolaram escada abaixo, quebrando os vidros da janela que dá no fim da escada. Irmão Geraldo sofreu leves escoriações, mas Lima sofreu ferimentos mais graves.

Peesedistas acusaram Adolar Wiese, udenista notório que estava na plateia, de ter empurrado Lima escada abaixo, versão nunca confirmada oficialmente.

Os ferimentos abertos pelos cacos de vidro causaram tétano em Lima, que no dia 7 de setembro de 1955 faleceu, com apenas 23 anos. O Correio do Norte homenageou o até então rival político. “Faury de Lima! Adversários que sempre fomos no trato das coisas políticas, dessa mesma política que tem o condão de desunir os homem, e que, no entanto, mais fortalecia nossa amizade. Era a maior esperança dessa novíssima juventude canoinhense.”

 

REAÇÃO

Se a relação entre UDN e PSD já não era das melhores, com a morte de Lima, a situação ficou ainda mais complicada. Os boatos de que Wiese teria causado o acidente foram fomentados, segundo o CN, pelo Barriga Verde. Pelas páginas dos jornais, o Correio do Norte atacava os peesedistas e o Barriga Verde detonava os udenistas.

O corpo de Lima serviu de trincheira para os dois rivais.

O desfecho foi dos mais trágicos. Francisco de Lima, sobrinho de Faury, convencido de que Wiese teria provocado a morte do tio, resolveu fazer justiça com as próprias mãos.

Armado com um revólver, Francisco deu um tiro à queima-roupa que atingiu o pescoço de Wiese, que conversava “em mangas de camisa” com Rodolfo Bayerl quando foi surpreendido por Francisco.

“Foram os artigos de jornalistas cheios de maldade e ódio, os criminosos boletins vermelhos e as palavras de vis caluniadores, que ocasionaram o desfecho macabro presenciado no dia 29 de janeiro (de 1956) em plena praça pública, em frente ao Bar Cordeiro”, registrou o CN. Wiese morreu aos 34 anos pouco depois no Hospital Santa Cruz. Depois de longa resistência, que incluiu um esconderijo no prédio onde hoje funciona a Autoescola Santa Cruz, no centro de Canoinhas, Francisco acabou se entregando por intermédio de Haroldo Ferreira, prefeito à época, que deixou o gabinete para persuadir o amigo a se entregar.

Francisco confessou o crime. Anos depois foi a julgamento no Fórum da Comarca. Não há registros no Fórum sobre sua condenação. O historiador Fernando Tokarski, no entanto, lembra que ele foi condenado pelo tribunal do júri e cumpriu alguns anos de pena fora de Canoinhas. Acabou voltando à cidade depois de cumprir parte da pena. Assim como os demais personagens dessa história, morreu em solo canoinhense.

Se houve crime na morte de Lima, até hoje, não se sabe.





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